Hoje, às compras na rua, senti o vento na cara e uma súbita vontade de te beijar. Daquelas vontades intensas que tenho às vezes. Começa com uma forte comichão nos lábios, espalha-se pela cara, desce num tremor à barriga e arrepia-me a pele do corpo todo. E sinto que tenho de te beijar imediatamente, um daqueles beijos fortes, colantes, que provocam trovoadas e nos fazem duvidar da tectónica de placas como explicação.
Mas depois o vento acalma e a vida segue, com milhentas preocupações a encherem-me os pensamentos, dúvidas, ânsias, decisões, risos e conversas, que retiram a urgência ao beijo e o afastam do meu corpo.
Quando por fim chegas a casa, cansado mas com os olhos quentes e risonhos, a pressa de partilhar o dia invade-nos e por entre as solicitações dos miúdos e o passeio do cão, o beijo esfuma-se, como se nunca tivesse tomado conta de mim. Haverá outros beijos e outros momentos, mas aquele perdeu-se para sempre, levado pelo vento que o sugeriu.
Quantos beijos teremos perdido já?